sábado, 19 de março de 2011

[0047] Um rádio Telefunken, uma licença que custou 25$00, memórias dos sons no éter

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No dia 15.Março.1963, o Chefe dos Serviços dos Correios, Telégrafos e Telefones de Cabo Verde, organismo com sede na Praia, passava a um residente em S. Vicente a licença para exploração de um posto radioeléctrico. Contudo, conforme se diz no documento, esse posto - afinal simples receptor de rádio da marca Telefunken - "somente [podia] receber emissões públicas de rádiodifusão". Sublinhe-se o "emissões públicas" que subentendia nas entrelinhas um "nem pensar em clandestinas"...

O proprietário do aparelho comprara-o a prestações, por volta de 1956, numa loja de mobílias na Cova da Piedade, Almada (que também transaccionava aparelhos de rádio). Terá sido este o único objecto por ele adquirido durante toda a sua vida por tal processo já que tudo o resto, sem outra excepção, o foi a pronto. Grande companheiro da família, foi através dele que aqui o PRAIA DE BOTE recebeu no espírito os primeiros, saudáveis e utilíssimos cromossomas da música cabo-verdiana. Todo o dia aquela máquina debitava na Capitania dos Portos, na sala que ainda hoje apresenta a segunda janela após o Plurim d'Pexe, para além das notícias e outros programas, mornas e coladeras sem fim. Grande Rádio Barlavento, grande Rádio Clube do Mindelo... palavras para quê? Recorde-se, a propósito, numa delas (RCM?),  a voz inesquecível de Hermenegildo Cardoso, cabo escriturário mondrongue da Capitania e radialista amador.

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 Resta dizer que o dono do radiozinho podia perfeitamente ter tido o aparelho clandestino durante os três anos que viveu na Rua de Praia. Ninguém o molestaria, dado o sítio em que o mesmo se encontrava instalado, repartição pública respeitada e com a qual nenhum chefe dos correios, por mais zeloso que fosse, interferiria para vasculhar... ou multar. Mas acontece que o sargento de que ali se fala era rigorosos cumpridor da lei e jamais lhe passou pela cabeça ter em casa um rádio clandestino. Por isso, pagou pela licença os gordos 25 paus que no papel se referem...

Veja-se ainda, a propósito da rádio sanvicentina, o texto no nosso amigo jornalista Carlos Lima (também ele ligado à Capitania dos Portos através do pai, o saudoso polícia-marítimo Orlando "Lola" Lima). E o carinho que atribui à acção de diversos nomes da rádio da terra, entre os quais os de Aníbal Lopes da Silva ou o do nosso colega bloguista Zito Azevedo.

NOTA FINAL: o aparelho ainda existe e, mais que isso, ainda funciona, embora com um ruído aqui, outro ali.

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